quinta-feira, fevereiro 16, 2006

Quem está levando essa pesquisa a sério?

(Sebastião Nery)

O periscópio de Clésio
Felisberto Batista Teixeira, delegado do Dops (Departamento de Ordem Política e Social) da polícia de Filinto Muller, no Rio, na ditadura Vargas, prendeu um operário acusado de ajudar o Partido Comunista:
- Confesse logo. Você é do PC! Ou ajuda o PC!
- Não sou não! Nem ajudo!
- Como é que você anda com eles? Então vai ter que dar o serviço todo. Você sabe! Você vai ter que contar!
E começou a torturá-lo. Bateu de palmatória, pôs no pau de arara, espremeu as unhas com alicate (ainda não haviam chegado ao choque elétrico). Deu telefones nos ouvidos, arrebentou o homem todo aos berros.
De repente, entrou na sala Luís Glayssman, chefe do serviço secreto da polícia, mandou parar a tortura:
- Não adianta você ficar aí resistindo, sem querer falar. Se você não falar, vai morrer. Fale logo. Diga onde está o mimeógrafo.
- Ah, o mimeógrafo? Isso eu sei. Está enterrado lá no fundo do quintal.
- Por que você não falou antes?
- Porque ninguem me perguntou. Este animal aí passou o tempo todo me batendo e perguntando onde está o "periscópio".

CNT e Sensus
O Brasil é um país mais do que surrealista, esquizofrênico. Na abertura da campanha presidencial, um senhor sub-judice, vasculhado pela polícia, pelo Ministério Público, pela Justiça, com milhões de reais em cheques de uma entidade pública jogados em outras contas, fabrica, por encomenda de alguém, uma "pesquisa eleitoral" como se fosse cacho de banana para a feira.
A CNT (Confederação Nacional dos Transportes) há muitos anos é dirigida e manipulada por um simpático e elegante pelego patronal, que, usando-a, arrumou para ser vice-governador de Minas.
Há algum tempo, assim como a CNI (Confederação Nacional da Indústria), promove pesquisas feitas pelo Ibope, a CNT passou a encomendar pesquisas ao Vox Populi, um instituto mineiro já de tradição e respeitado.
De uma hora para outra, ninguém nunca soube por que, o Clésio da CNT dispensou o Vox Populi e providenciou outro, um novo, desconhecido, um tal de Sensus, que passou a "pesquisar", quer dizer, a assinar "pesquisas" para ele. E foi esse insensato Sensus que produziu essa nova "pesquisa". Mas não é uma "pesquisa". Como na sala de tortura, é um "periscópio".

Ibope e Enéas
Pesquisa sabe-se o que é: a voz do dono, a voz de quem encomenda e paga. Ainda na semana passada, o deputado Enéas, do Prona, reclamou do Ibope porque, nas pesquisas do instituto, o nome dele não está aparecendo. O Ibope mandou uma resposta:
"O Ibope-Opinião realiza pesquisas sob demanda de clientes e os mesmos nem sempre aceitam ou consideram a inclusão do candidato do partido Prona nas perguntas de intenção de voto para presidente da República. Até o registro oficial das candidaturas, as listas testadas podem variar de pesquisa para pesquisa, de acordo com nossos clientes. Ressaltamos ainda que as pesquisas que forem realizadas por iniciativa do próprio Ibope contemplarão, certamente, o nome do candidato do Prona".
Como faltam oito meses para as eleições, toda pesquisa agora é um salto no escuro. Mas há cambalhotas que desmoralizam o cambalhoteiro.

Clésio e Valério
As conhecidas e notórias impressões digitais do Clésio estão lá: uma "pesquisa" para agradar a Lula e ao governo. Mais do que agradar, imobilizar, amordaçar o governo. Sócio, professor e consultor de Marcos Valério no escândalo do Mensalão, do Valerioduto, do PTlama e do Lula-gate, o Clésio da CNT imagina que, com o cacho de banana do Sensus, vai impedir que a Polícia Federal, o Ministério Público e a Justiça continuem atrás dele.
Até o Cesar Maia, capitão de longo curso, ficou escandalizado:
"A pesquisa Sensus é completamente inconsistente, tem cheiro de pesquisa forjada. No Ibope (em janeiro), Serra e Alckmin tinham entre 7% e 9% de rejeição. Agora, no Sensus, têm entre 39% e 41% de rejeição. Defendo que os partidos peçam uma auditoria técnica no Sensus. Há cheiro de um apêndice do Mensalão. Afinal, quem contrata é suspeito e era sócio do Marcos Valério. A auditoria no Sensus para a pesquisa, que tem todo jeito de ser forjada, é urgente, para que se pare de manipular pesquisas eleitorais. O Clésio Andrade da CNT foi sócio do Marcos Valério do Mensalão".
E a Globo ficou com tanta vergonha da "pesquisa" que não pôs no ar.